sábado, 25 de agosto de 2012

(a)corda para a vida: pão fresco e outras coisas.

Hoje de manhã acordei muito cedo. Fiquei quieta na cama à espera que o sono regressasse mas ele já tinha voado até outras paragens, pelo que fiquei deitada apenas o tempo suficiente para aproveitar o morno dos lençóis e repousar um pouco mais o pensamento na almofada.
Depois decidi que devia levantar-me e começar o dia. Os dias começados cedo, são sempre mais longos, mais prazenteiros, mais melosos e aconchegantes. Levantei-me, e assim de cabelo ainda despenteado e cara ensonada fui comprar pão quentinho e leite.
E enquanto regressava a casa para fazer o meu pequeno almoço, o sol que despontava no alto, bateu-me na face, e entre o cheiro da canela que se desprendia do pão, a sua quentura na minha barriga, e o seu sabor na minha boca, dos pedaços já debicados no caminho, eu sorri. Estes momentos de simplicidade pura, de verdade honesta, de cumplicidade com a vida são um aperto doce no coração e a força invisível de que preciso para continuar.
Claro que não é tudo um mar de rosas e esta não é a minha formula mágica para que tudo corra bem ( até porque não correu, e hoje já fiz asneiras, mas isso são outros quinhentos), mas é o pavio necessário para que a minha vela continue a arder.
Não tenho sido a pessoa que quero ser. A pessoa que os meus avós com tanto carinho e esforço criaram, a pessoa que os meus pais esperavam que eu fosse, que eu própria tinha decidido ser.. Sou eu. Sempre complicada, sempre insatisfeita, sempre contraditória e sempre inconstante. Sou eu, rabugenta, às vezes sisuda, às vezes chata... mas eu numa tentativa constante de ser melhor. E sei que ás vezes consigo. Às vezes sinto-me capaz. Sinto que sou melhor. Que estou melhor. Há uma engrenagem qualquer dentro de mim que me leva a perdoar de uma forma que nem eu entendo, que me leva a esquecer o que teima em querer magoar, que me leva a tentar o que já todos tomaram como perdido ou perda de tempo.
Sou eu disposta a ceder, a mudar de sentido, a descompreender para poder compreender. Sou eu disposta a perder todo o sentido e toda a lógica para que mais tarde possa ser capaz de compreender tudo com uma visão mais corajosa e mais positiva.
Sou eu disposta a abdicar, para que depois as coisas possam regressar melhores, mais completas, mais tranquilas.
Hoje não há receitas, não as pode haver sempre. Não há receitas para a vida acima de tudo. Não há conselhos que possam resolver tudo, não há preces milagrosas, nem comprimidos de felicidade. A receita para a vida não se faz com medidas rigorosas, nem com passos ordenados. As coisas acontecem e nós temos de ter simplesmente a coragem de não desistir e de continuar a bater, a moldar, a cortar, a amassar, a esperar, a rechear a vida e as circunstâncias que a circunscrevem o melhor que conseguimos.
Se o fizermos certamente que a nossa receita dará certo, podemos queimar-nos em alguns momentos, perder o controlo noutro, ver tudo perdido, mas se tivermos calma e paciência iremos ver que ás vezes basta ter confiança e acrescentar água, dar tempo à fervura e deixar tudo repousar e arrefecer calmamente.
Hoje não vos trago receitas, ingredientes, procedimentos. Este Blog não é apenas sobre isso. É sobre muito mais: é sobre a vida, a minha vida e o modo como a vivo e como a encaro.
Hoje de manhã, tive aquele lampejo de felicidade, ou de alegria. Tive o ponto certo a remendar o meu coração, a nota certa a compor a melodia desafinada da minha mente, tive a inspiração certa para escrever este texto. E só por isso valeu-me acordar assim tão cedo e começar a viver, tentando, recomeçando, esperando.
Foi um momento simples: pão morno com um toque de canela e leite com café. talvez por não esperar mais, algo tão simples resultou.
Talvez se eu for capaz de deixar tudo fluir, a vida me mostre que afinal não é assim tão complicada ou tão difícil como eu às vezes penso que ela é.
Talvez.


sexta-feira, 24 de agosto de 2012

A vida revisitada num ano: Massa Choux com Caramelo


-"Achas que és feliz?"- perguntou.
Ela esperou para responder. Não era uma pergunta fácil. Tinha de ser verdadeira na resposta.
- A vida é como um prato de comida. Tudo depende dos ingredientes que lhe adicionares...pode ser leve e adocicada ou dura e amarga. É tudo uma questão do que sabemos colher, o que colhemos e como o conservamos.
- Para ti está tudo relacionado com a comida?
- Talvez.. não sei... na cozinha há muitas escolhas, muitas indecisões, há mil combinações e caminhos a seguir. Não é fácil. A vida também não o é. Mas depois o resultado final surpreende-te, deleita-te... aquece-te.
-Hum...
- quem não se apaixonou pelas coisas não entende os mistérios que há. Não se trata só da comida... é tudo. Se sou feliz? Sou. Sou feliz a cozinhar, sou feliz a ler.. sou feliz a pintar.. sou feliz a escrever, sou feliz a contemplar e sou feliz por em certos e puros momentos poder ser feliz. Se é felicidade ou gratidão não sei. Acima de tudo quero ter paz, quero poder fazer o que gosto e quero amar. Basta-me."

Escrevi isto o ano passado.
Já fervia a paixão, a vontade, a necessidade de misturar e amassar.
Já sonhava com mesas postas, já saboreava sabores etéreos, já conhecia texturas e formas.
Neste ano que passou, as coisas amadureceram, mudaram. Eu mudei. A tentar saber ainda estou, se amadureci ou se "esverdeei". A vida foi dura este ano, e talvez eu me tenha tornado dura também. E o que fazemos quando a fruta está dura? deixamo-la ao sol uns dias para ela amadurecer lenta e adequadamente. O meu coração precisa de sol. Precisa de ferver em lume brando, entre os cheiros e sabores da canela e do anis. Preciso de luz e paz, de tempo e de calma.
Preciso de acalmar as tempestades, de temperar de novo a minha vida, de me diluir como quem dilui uma compota que ficou demasiado espessa.
Preciso de descansar, de repousar, antes que tenha de enfrentar de novo o forno e ser transformada.
Tem tudo a ver com a cozinha? cada vez mais me convenço que sim, na minha vida tem!
A minha mente, as pontas dos meus dedos, todo o meu coração precisa de coisas belas, de coisas antigas, de coisas brancas, rendadas, abotoadas, douradas do sol, algumas gastas, outras partidas, outras recuperadas, inventadas... coisas preciosas e únicas para mim . Nos meus dias eu preciso de imagens, de música e de sabor.
Quando era garota gostava de brincar com a terra, gostava do cheiro dela quando húmida depois de uma chuvada de Verão, gostava da sensação morna de me deitar sobre a erva e inspirar fundo. Ainda gosto. Ainda sinto. Mas agora, sinto exactamente o mesmo quando cozinho, quando sinto as massas coladas às maos, quando cheiro e provo os molhos e recheios, quando parto vegetais em quadrados minúsculos, quando fervo frascos, quando colho frutas e legumes, quando barro manteiga no pão acabado de sair do forno. Sinto que isso acalma o meu pensamento e o meu coração. Sinto que preciso disso para aguentar e seguir em frente.
Gosto do ritmo caótico e desordenado da cozinha. Gosto de barafustar com as mil coisas que tenho de fazer ao mesmo tempo. Grito e reclamo e depois rio-me quando me queimo, quando salpico tudo, quando a bancada é um mar de molho, ou de caramelo, ou de creme de pasteleiro. Gosto quando o chocolate salta e me sujo toda. Gosto simplesmente.
Gosto de gastar mil e um tachos e taças, de usar todos os garfos e colheres de pau, de atafulhar o fogão. Gosto deste caos. Sinto-me bem neste caos, a esta velocidade, ora lenta, ora frenética; gosto de no fim parar e apreciar somente.
Gosto do cansaço que precede tudo.
Este ano que tem decorrido, tem sido um dos mais amargos da minha vida, mas cozinhar tem-me ajudado a ajustar tudo,a adoçar tudo, a tornar tudo menos penoso e menos escorregadio.
E nesses momentos, intensos, quase decadentes, em que está tudo de pernas pro ar e eu não sei para que lado me virar, entre mexer um creme, desligar o forno e bater um merengue, eu sou puramente feliz.
Resta-me pois segurar bem esses momentos, traduzi-los no melhor que for capaz e continuar a ter fé e a aprender.
Sinto que isto é apenas o inicio de uma bela e longa jornada. E eu sinto que estou preparada para respirar e começar a caminhar.
Finalmente.


Choux recheados com creme de pasteleiro e cobertos com caramelo

Ingredientes:
Massa de Choux:
-160 gr de Farinha T65
-100 gr de manteiga
- 1 colher se chá de sal
-2 colheres de chá de açucar
-4 ovos
-250 gr de água

Creme de pasteleiro(como eu o faço):
-250ml de leite
-150 gr de açucar
-3/4 colheres de farinha Maisena
-4 gemas
-casca de um limão
-1 pau de canela

Caramelo:
-1 chavena de chá de Açucar
-meia chavena de chá de agua quente

Procedimento:
Num tacho colocar a água, a manteiga, a farinha e o açúcar. Levar ao lume até a manteiga derreter e o sal e o açúcar dissolverem. De seguida juntar a farinha e mexer bem de modo a que os ingredientes se misturem e a massa descole das paredes do tacho.
Deixar arrefecer um pouco, bater e juntar um ovo de cada vez até que a massa adquira um tom amarelo (relativamente forte).
Aquecer o forno a 180º.
Colocar a massa num saco de pasteleiro e fazer pequenas bolinhas num tabuleiro com fundo coberto com papel vegetal.
A massa é bastante moldável, pelo que se não tiver saco de pasteleiro pode perfeitamente colocar as bolinhas com uma colher ou até moldá-las com a própria mão que ela não agarra.
Levar o tabuleiro ao forno e baixar a temperatura para 170/160º. Deixar cozer durante 30/40 min. até as bolinhas de choux ficarem douradas. Deixar arrefecer no forno. Entretanto pode fazer o creme de pasteleiro.
Leve ao lume o leite, com o pau de canela e a casca do limão e deixe ferver. Numa taça junte a farinha e o açúcar e noutra taça bata os ovos. Quando o leite ferver retire as cascas e o pau de canela e junte a mistura de açúcar com a farinha. De seguida envolva os ovos batidos e mexa sempre em lume brando até espessar.
Deixe arrefecer.
Quando o creme estiver morno ou frio, com o bico mais fino do saco de pasteleiro ( ou uma seringa como eu usei) faça um pequeno orificio nas bolinhas e recheie com creme. Por fim faça o caramelo. Leve o açúcar num tacho ao fogão até que este derreta e fique em ponto caramelo ( castanho escuro). De seguida junte pouco a pouco a  água quente. É possível que se forme uma espuma. Não se preocupe é normal. Mexa sempre até dissolver bem e o caramelo espessar um pouco. Retire do fogão. Molhe cada bolinha de Choux no caramelo e coloque as bolinhas num prato. Pode acompanhar com o restante creme.

Os recheios das bolinhas Choux pode variar, entre creme pasteleiro, gelado, chantili, natas, mousse de chocolate, bem como a sua cobertura: caramelo, ganache, açúcar em pó ou fios de ovos. É só puxar pela imaginação e jogar com os ingredientes que se tem em casa.


segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Os prazeres simples e honestos da vida.

Um dia perguntaram-me o que me fazia feliz.
E eu não precisei de pensar muito... eu sei o que me faz feliz! as coisas simples  e genuínas.
Mas essas, tem-me mostrado a vida e as próprias pessoas, são as coisas mais difíceis de alcançar.
No que diz respeito à comida, e já dizia a Julia Child, as coisas não tem de ser complicadas ou demasiado elaboradas. O que se pretende para quem ama a cozinha é comida simples e honesta feita com ingredientes frescos e de qualidade.
O que eu quero na cozinha, é o que eu quero para a vida.
E quando penso nisso nada me parece mais simples e mais honesto do que uma fatia de pão morno e uma caneca fumegante de café.
Se a vida fosse só isso, eu seria perfeitamente feliz. Quiçá um dia...

Pão de trigo e centeio e Focaccia de Olivas (azeitonas) e Pancetta ( Bacon)

Para o pão:

-1,5 kg de farinha de trigo
-1 kg de farinha de centeio
- fermento  de padeiro
-1 colher de manteiga
-4 colheres de açúcar
-1 pitada de sal
-Água morna
-5 ovos

As medidas são um pouco a olho. A minha tia que já tem anos nisto de fazer pão é que vai ajudando com as medidas (a olho=)). Quando lhe pedi as medidas ela disse-me:" oh rapariga, isto é a olho. O que vale é ter umas boas mãos e um coração quente".

Preparação:

A primeira coisa a fazer é amassar o fermento com um pouco de farinha e agua morna e deixá-lo crescer até ao dobro.
quando o fermento "dobrou" é hora de fazer e amassar o pão. Numa taça grande colocar a farinha, fazer um buraco no meio e colocar lá todos os ingredientes, bem como o fermento amassado. Amassar e enrolar a massa até estar tudo envolvido. Tapar a taça com um pano e reservar até a massa levedar até ao dobro.
Entretanto enquanto se aguarda pode-se aquecer o forno. Nós usamos forno a lenha, o que até atribui uma cor mais bonita e um melhor sabor ao pão.
quando o forno tá quente, é necessário polvilhar a superfície onde se vai trabalhar e moldar o pão com bastante farinha. Podem moldá-lo redondo, em cacete, grande, pequeno, ao vosso gosto. Quando estiver pronto, basta polvilhar um tabuleiro com farinha, colocar o pão e levar ao forno.
quanto ao tempo de cozedura, este varia de forno para forno e é necessário ir controlando através da cor e de um palito grande.
O pão cozido normalmente tem um tom castanho dourado, cheiro intenso e o palito depois de retirado não trás massa agarrada. No nosso forno são cerca de 25 minutos.

Focaccia:

-Azeitonas descaroçadas e previamente laminadas
-azeite
-Bacon

Para a Focaccia usamos a mesma massa do pão,embora haja mesmo receita para a massa de focaccia de colocarei no fim. A massa foi estendida em todo o comprimento de um tabuleiro, com uma folha de papel vegetal por baixo, untada com azeite em toda a sua extensão e foram feitos os buracos característicos deste pão. De seguida colocou-se sobre o pão as azeitonas ás rodelas e o Bacon. Levou-se cerca de 20 minutos ao forno e Puf! Ficou Molto buono! Basta acompanhar com uma salada e tem uma refeição fácil, diferente e ligeira.
Ou devo dizer simples e honesta?


Ingredientes para 1 focaccia:

-500gr de farinha de trigo

-1 saqueta de levedura seca 
-315 ml de água morna
-15 gr de sal
-15 gr de açúcar
-azeite q.b.
-pimenta
-flôr de sal


Os procedimentos são idênticos.


                                                              


sábado, 18 de agosto de 2012

dos amores pelos sabores ao compo(r)tamento

Compotamento: Acto ou efeito de compotar, ou seja fazer compota.
Concordam?
Hoje compo(r)tei bem... ou pelo menos tentei.
Hoje foi um dia árduo e longo, pelo que pedia que eu o adoça-se com algo.
Logo pela manhã saiu-me uma compota (que ficou suberba) de morangos e amoras silvestres. Seguiu-se uma tarte requerida pelo meu irmão, com natas, massa de bolacha e flambé de morangos e no fim do dia, desta vez a pedido de todos, uma lasanha com pasta fresca.
Vamos a ver como nos sai o jantar de sabores.
Resta-me esperar por amanhã e continuar a compo(r)ta-me bem nesta nova aventura.

Compota de morangos e amoras silvestres

Ingredientes:
-800 gr de fruta (morangos e amoras)
-600 gr de açucar ( fiz as contas e fiz metade adoçante, metade açúcar e ficou bom)
-2 colheres de chá de essência de baunilha.
- sumo de 1 limão

Procedimento:
Levar tudo num tacho a lume brando, até ferver. Ir mexendo com a colher de pau. inicialmente fica uma mistura liquida que vai espessando. Quando se verificar que começa a espessar ir experimentando num prato até formar ponto de estrada.
Retirar do lume e colocar em frasco hermético. Conservar num local fresco e seco.
esta compota é óptima por exemplo para fazer tarteletes.

Tarte de natas e morangos flambé

Ingredientes:

Base:
-1 pacote de bolacha Maria
-200 gr de manteiga amolecida

Creme:
-2 colheres de chá de essência de baunilha
-2 pacotes de natas
-100 ml de leite
-3 folhas de gelatina
-90 gr de açúcar

Flambé:
-morangos
-2 colheres de sopa de açúcar
-1 colher de sopa de manteiga
- rum ( eu usei Favaios e ficou bom)

Procedimento:
Colocar as bolachas e a manteiga derretida na trituradora e misturar tudo.
Forrar com a massa o fundo da tarteira e espalhar bem a massa até ao limite da tarteira. Reservar.
Num tacho colocar as natas, o leite, a essência de baunilha e o açúcar, e antes de ferver desligar e adicionar as folhas de gelatina já demolhadas e escorridas. Mexer bem para incorporar.
Adicionar o preparado à base de bolacha e levar ao frigorífico por 3 horas.
Para fazer o flambé basta derreter numa frigideira anti-aderente a manteiga, adicionar o açúcar e os morangos lavados e laminados e deixar cozinhar.De seguida acrescentar o Favaios ( eu usei cerca de  um cálice pequeno)  e deixar flambear até o álcool evaporar. Deixar arrefecer e deitar sobre o creme da tarte. Levar ao frigorífico até servir.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

é assim a vida amor(a).

Dizem que encontramos as melhores coisas da vida quando menos esperamos e conhecemos as pessoas mais importantes nos locais mais improváveis.
A minha vida tem sido um caos desordenado, neste estranho ano bissexto. As leis de Murphy têm actuado como se prevê que actuem, e eu tenho tentado pacientemente, não antecipá-las, mas digeri-las.Mas ás vezes é mais fácil digerir a vida, quando há alguma coisa doce com que contornar as amarguras de cada dia.A  mim calhou-me uma estrada ladeada de silvas. Que desgraça. Já não chegam as que tem o coração, ainda temos de lidar com as do caminho que fazemos, de manhã cedo, com vista a espairecer a mente.Pois, mas tal como na vida, sem silvas não há amoras e sem amoras não há compota.Gostei desta descoberta. Gostei tanto que andei todo o restante dia a ansiar pela manhã enevoada para ir lançar-me às silvas! Literalmente! arranhei-me, cortei-me, esfolei-me e enlameei-me mas no final tinha o meu tesouro! uma taça enorme cheia de amoras para fazer a minha compota. Será o meu coração a pedir Inverno? não sei... mas ele falou, e eu obedeci fazendo-lhe a (ben)dita compota. Para quem não sabe eu adoro compotas. Desde criança que sou puramente básica e só como queijo fresco (ou primos deste) e compota ou marmelada. Queijo e fiambre não são muito chegados à minha alma e aos meus gostos.Mas compotas? até à colherada as como. E esta saiu-me bem. Primeiro espessa, depois mais fluída, depois perfeita.Mas eu não queria fazer um prazer solitário e decidi que a melhor pretendente a casar com a minha compota de amoras silvestres seria uma Panna Cotta simples.Ora a compota chegou primeira, vermelhinha e doce e teve de esperar 3 horas pela companheira pálida. A junção das duas foi um casamento perfeito entre o que é simples e honesto. Até os mais esquisitos pediram Bis! E eu sorri. Feliz, porque naquele momento eu entendi que através das silvas da minha vida, eu serei capaz de juntar coisas boas a coisas honestas e criar algo único e fantástico.

Panna Cotta Simples

Ingredientes:
-3 folhas de gelatina
-5 decilitros de natas (ou uma mistura de natas e leite)
-90 gramas de açúcar

Preparação:Colocar as folhas de gelatina de molho em água fria durante 5 minutos. Aqueçer as natas com o açúcar e  quando estiver quase a ferver desligar o lume e acrescentar as folhas de gelatinas bem espremidas, mexendo até dissolver.Deitar a  panna cotta em forminhas individuais e levar ao frigorífico pelo menos durante 3 horas.Antes de servir desenformar cuidadosamente a panna cotta, mergulhando  o fundo das forminhas alguns segundos em água quente, e decorar a gosto.


Compota de Amoras silvestres

 Ingredientes:
-1kg de amoras silvestres
-Cerca de 850 gr. de açúcar
-Um pouco de água
-1 pau de canela( opcional)
-Sumo de 1 limão

Preparação:
Colocar tudo num tacho e levar ao lume. Inicialmente a mistura é fluida, mas depois começa a espessar. É necessário que o processo ocorra sempre em lume brando e que se vá mexendo com uma colher de pau. Quando a compota começar a engrossar, ir experimentando num prato até formar ponto estrada (quando de passa uma colher a compota separa-se formando uma estrada). Se já tiver passado este ponto e estiver muito espessa basta juntar um pouco de água ( não necessita acrescentar mais açúcar) e deixar ferver. Mal ferva, desligue. Depois de fria a consistência tende a ser maior.Coloque em frascos herméticos e deixe arrefecer antes de fechar. Guardar no frigorífico ajuda a conservar por mais tempo.



terça-feira, 14 de agosto de 2012

O dia de Janeiro em que comi a tal laranja...



Não sei se era mesmo Janeiro, mas sei que  estava frio, mesmo muito frio.
Aquele frio que se entranha e se espalha por todo o corpo.
Sei que estava em casa, felpuda e quentinha, provavelmente a beber café quente e forte e a estudar.
Mas como o meu estudo tem horas incertas e pouco simpáticas de desconcentração, a coisa mais certa é ter divagado para outras paragens.
E foi nessas paragens, entre aromas de café e de um Inverno solarengo a entrar sorrateiro na janela e a bater-me na cara, que entre tudo o que poderia ser simples e descomplicado eu compreendi o que queria fazer para a vida.
Durante muito tempo adorei comer. Mas comia não pelo mesmo prazer de agora, mas por um outro prazer, açucarado e de rápida absorção, sem compreensão dos procedimentos ou dos proveitos que poderia usufruir de tal gesto.
Talvez por isso, e para que agora pudesse compreender tudo de uma forma diferente, mais tarde na minha vida ( embora ainda cedo, visto só ter 14 anos) entrei em guerra com a comida. Dissequei-a a calorias e gorduras e ás transformações horríveis  que ela produzia no meu corpo. Rejeitei-a, ignorei-a, odiei-a, esqueci-a, tirei-lhe todo o sabor e textura possível.
E vivi, assim, perdida, quase 8 anos.
Claro que as tréguas chegaram mais cedo, por volta dos meus vinte, mas ainda era um relação frágil e insossa, sem forma nem conteúdo. Não era perdão, era simplesmente conformidade: a aceitação de que tinha de comer para viver.
Quando é que tudo mudou?  Não foi nessa manhã fria, foi antes.
Foi mudando aos poucos. Mudou quando provei pela primeira vez comida asiática, ou italiana, ou mexicana.
Mudou quando começei a ajudar a preparar os doces do Natal, ou quando fui pela primeira vez ao Starbucks e bebi o melhor chocolate quente da minha vida com um maravilhoso cupcake.
De cada vez que comia um gelado de café, ou um crepe chinês ia mudando.
Mudei, quando por obrigação me vi deparada com ovos, farinha, açúcar e uma receita de bolo.
E assim, aos poucos comecei a apaixonar-me. E quando dei por mim já ansiava pelos pedidos da minha mãe para fazer as sobremesas, ou pelo requerimento da minha tia para ajudar com o pão.
Lembro-me de ir com o meu Padrinho comprar um fogão de lenha para ela (a tia) e de desejar profundamente ter um também para cozinhar coisas fabulosas e fantásticas. Ia ser o meu caldeirão de poções, a minha janela para saltar.
Aos poucos vi-me a fazer tartes atrás de tartes, a amassar massas, a ver a cozedura apropriada para as bolachas, a inventar recheios e a experimentar sabores e combinações, a pedir encarecidamente que me dessem livros de cozinha, a ansiar ir comer fora e provar novas coisas.
Vi-me a passar horas na cozinha a inventar, com uma frequência ao outro dia, porque tinha de ser. Porque não podia mais fugir a esta vontade estranha e entranhada.
Vi-me a desejar cozinhar para outros, a ver o prazer deles a comer os meus pratos, e a rirem-se desalmadamente da minha cara quando as coisas me corriam mal...porque as coisas às vezes correm-me MESMO muito mal.
Quero tanto fazer as coisas, que me esqueço de seguir as receitas apropriadamente, medir ingredientes, seguir passos. E no fim.. PUF, sai uma desgraça, que só compensa pelo prazer que me dá no processo.
Já não sei como mudar isto, e não quero mudar.
Desejo a possibilidade de poder fazer tudo o que quero, mesmo que o resultado final não seja o melhor. Tentarei e tentarei e tentarei até melhorar. Tenho uma vida inteira para aprender e praticar.
Fugi à questão da laranja e da súbita descoberta do que quero fazer? pois parece-me que sim.
Quanto à descoberta, basicamente decidi que um dia hei-de conseguir ter um negócio(zinho) meu, uma coisa simples que junte comida e livros, pois são a minha grande paixão.. e eu creio que fomos feitos para viver as nossas grandes paixões.
Quanto à laranja, é um segredo descoberto que não sei explicar. Nada me dá mais prazer do que comer uma laranja num dia frio. Uma laranja grande e doce. É estranho como uma coisa fria pode aquecer a alma mais do que qualquer fogueira.
É isso o que as laranjas me fazem. Aquecem-me a alma e fazem-me recordar do meu sonho.
Claro que não caminho só nesta aventura. Tenho tentado aprender as minhas lições através do exemplo dos que já andam nisto há mais tempo que eu  e que sem pretensões revelam aquilo que aprenderam e descobriram, como se fossem tesouros de tal forma preciosos e sublimes que tivessem de ser partilhados.
Ainda me falta muito, mas como já disse chegarei lá. Devagar. Como quem descasca uma laranja sumarenta  ao sol frio de Janeiro e se deixa ficar quieto a sentir o sumo espalhar calor no coração e sentido na vida.


Uma pessoa inspirada que me inspirou no meu percurso:Regina Gaspar